Manaus (AM) — Mais de 60% da exploração madeireira no Amazonas, entre agosto de 2023 e julho de 2024, ocorreu sem autorização ambiental. O dado, divulgado nesta sexta-feira (05) pelo Imazon, confirma a permanência de uma estrutura ilegal robusta, que se expandiu na esteira do desmonte das políticas de fiscalização e do enfraquecimento dos órgãos ambientais durante o governo Bolsonaro. Ao todo, foram mapeados 42 mil hectares de retirada clandestina, em um total de 68 mil hectares monitorados por satélite.
A pesquisa integra a Rede Simex, formada por Imazon, ICV e Imaflora, e mostra um aumento de 9% na exploração ilegal em relação ao período anterior.
A ascensão reflete a atuação de redes criminosas que se aproveitaram da desregulamentação e da retórica antiambiental estimulada pelo bolsonarismo, criando um mercado paralelo que hoje opera com logística, financiamento e apoio político regional.
A extração legal, embora tenha crescido de 11,3 mil para 26,1 mil hectares, não acompanha a força da cadeia clandestina, que ainda controla a maior parte do setor e funciona como porta de entrada para crimes associados, como queimadas, grilagem e desmatamento.
Em áreas onde houve estímulo explícito à ocupação ilegal — como no chamado corredor Amacro — a pressão sobre a floresta permanece alta.
Dois municípios da região, Boca do Acre e Lábrea, concentram 75% da exploração irregular. Ambos se tornaram símbolos de um modelo agressivo de ocupação territorial que se fortaleceu durante a extrema-direita: avanço de serrarias ilegais, entrada de grileiros, loteamentos clandestinos e conversão acelerada da floresta para pastagens e grãos.
Nesse contexto, a retirada de madeira não é um fim, mas um primeiro passo para transformar terras públicas em ativos privados.
A pesquisa mostra ainda que 5,6 mil hectares de exploração ilegal ocorreram dentro de áreas protegidas — um número equivalente a mais de 5 mil campos de futebol. Terras indígenas foram as mais atingidas.

Essas invasões são reflexo direto da política anti-indigenista e antiambiental do governo Bolsonaro, que estimulou ocupações e fragilizou mecanismos de proteção. Mesmo com a retomada da fiscalização, desmontar redes criminosas estruturadas ao longo de quatro anos é um processo lento e complexo.
O Imazon destaca que 77% de toda a exploração irregular ocorreu em imóveis rurais inscritos em cadastros públicos, como o CAR. O dado desmente o argumento — difundido por setores ligados ao agronegócio durante a gestão Bolsonaro — de que a ausência de informação inviabilizaria a fiscalização.
A informação existe. O que houve, entre 2019 e 2022, foi a recusa deliberada em utilizá-la para coibir o crime, o que permitiu que grupos ilegais se consolidassem como estruturas quase empresariais.
Também chamam atenção as florestas públicas não destinadas (FPNDs), que concentraram 8% da extração irregular. Ao longo da última década, essas áreas se tornaram alvo prioritário de grileiros, especialmente durante o discurso bolsonarista de “regularização automática” de ocupações ilegais.
Leia Mais
Destinar essas terras à conservação ou à gestão comunitária — como recomenda o Imazon — é uma forma de impedir que redes criminosas convertam patrimônio público em fronteira de lucro privado.
Os dados indicam que o país ainda enfrenta o passivo de um período marcado pelo ataque sistemático à proteção ambiental. Hoje, a retomada da fiscalização encontra uma máquina criminosa madura, com ramificações locais e interesse econômico consolidado.
Combater essa estrutura exige coordenação federativa, presença contínua do Estado e fortalecimento das alternativas sustentáveis — condições fundamentais para que a Amazônia deixe de carregar, sozinha, os efeitos de um projeto político que colocou a floresta à venda.











Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.
Ainda não há comentários nesta matéria.