Brasília (DF) — A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal retoma nesta terça-feira (18) o julgamento da Ação Penal 2696, que investiga o chamado “núcleo 3” da trama golpista — grupo de militares acusados de arquitetar uma ruptura do Estado democrático de direito no Brasil. O reinício dos votos do relator e dos demais ministros marca uma fase decisiva do processo, em que a institucionalidade é posta à prova e onde o sistema de justiça terá de responder se a força militar pode ser responsabilizada por conspirar contra a ordem democrática.
O núcleo investigado é composto por oficiais da ativa ou da reserva do Exército e de um agente da Polícia Federal. Segundo a acusação da Procuradoria‑Geral da República, eles integravam esquema para pressionar a cúpula militar, disseminar desinformação e elaborar planos para prisão de autoridades como Alexandre de Moraes, caso fosse concretizado o golpe de Estado.
As defesas contestam a robustez das provas e afirmam que muitos dos atos apontados não configuram execução, mas mera hipótese investigativa.
No primeiro dia de julgamento, que ocorreu na sessão anterior, já foram apresentadas as sustentação oral do relator e da acusação, e ouvidas as defesas de alguns réus.
A retomada dos trabalhos nesta terça-feira assume caráter simbólico porque consolida o calendário de votação que poderá definir penas, responsabilidades e estabelecer precedente para casos que envolvem militares e planos de ruptura democrática.
A acusação sustenta que o plano ultrapassou o estágio de articulação: envolvia documento estratégico denominado “Operação Luneta”, encontros denominados “kids pretos”, pressão sobre o comando do Exército e mobilização das Forças Especiais, conforme levantamento da PGR.
Segundo o relator, há indícios de atos de execução ou quase execução, o que agrava o cenário para os acusados. Se confirmada a culpa, trata-se de desdobramento histórico, na medida em que militares são julgados por conspirar contra a democracia.
As defesas, porém, clamam por distinção entre o que denominam de “pressões políticas e militares legítimas” e o crime de golpe de Estado. Advogados argumentam que muitos dos encontros eram de rotina institucional e que a denúncia baseia-se em documentos e mensagens interceptadas com lacunas importantes de contexto.

Este contraste revela a tensão que o julgamento carrega: entre a responsabilização de atores estatais por ameaçar o regime democrático e o risco de se confundir manifestações de poder militar com crime político-institucional.
Para além da esfera jurídica, o processo traz implicações diretas para a democracia brasileira, o papel das Forças Armadas e o princípio da civilidade sobre o uso da força.
Em um país em que manifestações golpistas se tornaram parte do debate político, o julgamento serve como resposta institucional — ou será o sinal de que o sistema tolera violações de ordem democrática quando praticadas de dentro do Estado.
Na medida em que o julgamento se aproxima da votação dos votos individuais, abre-se também uma janela para avaliar a credibilidade institucional da corte e a possibilidade de punição real.
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Caso os réus sejam condenados por crimes como tentativa de golpe de Estado ou participação em organização criminosa armada, estará lançada uma nova era de controle sobre abusos das Forças Armadas. Caso contrário, prevalecerá a percepção de impunidade.
O desfecho deste processo ainda não está escrito, mas o que está em jogo é mais do que as penalidades: trata-se da resposta da Justiça brasileira a quem ameaçou a ordem constitucional.
Se o STF decidir punir com rigor, mandará mensagem de que a democracia não pode ser alvo de corporações armadas; se vacilar, estará enviando o sinal oposto — de que o Estado pode gerir e tolerar rupturas da própria norma que o sustenta.



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