Com dólar abaixo de R$ 5,35, exportadores de café e açúcar perdem fôlego

Real valorizado pressiona margens dos exportadores; café ainda encontra alívio em preços internacionais elevados, enquanto açúcar sofre com produtividade menor e ATR em baixa

Com o dólar negociado abaixo de R$ 5,35, exportadores de café e açúcar enfrentam margens comprimidas. O café ainda se apoia em preços internacionais elevados, que compensam parte da perda cambial, enquanto o açúcar sofre com perda de produtividade, menor qualidade da cana e recuo nas cotações externas.

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Câmbio valorizado e margens estreitas

A trajetória recente do real reflete uma combinação de juros elevados no Brasil e expectativas de cortes mais agressivos nos Estados Unidos. Esse diferencial atrai fluxo para a renda fixa doméstica e sustenta a moeda em patamares fortes.

Para setores exportadores, o efeito é imediato: cada libra-peso de café ou tonelada de açúcar embarcada rende menos reais, mesmo quando a receita em dólar cresce.

O uso de hedge cambial e contratos futuros ameniza o choque, mas não resolve o dilema. Ao mesmo tempo em que o câmbio reduz o valor recebido, os custos de produção dentro do país continuam subindo, tornando a margem cada vez mais apertada.

É nesse contexto que café e açúcar, duas das principais commodities brasileiras, seguem caminhos diferentes diante do mesmo desafio cambial.

Café: menos volume, mais receita

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No caso do café, a queda do dólar não anulou o desempenho das exportações. Em agosto, o Brasil embarcou 3,144 milhões de sacas de 60 quilos, volume 17,5% inferior ao registrado um ano antes.

Apesar da retração, a receita cambial avançou 12,7%, alcançando US$ 1,101 bilhão, sustentada pelo rali dos preços internacionais. No acumulado dos sete primeiros meses do ano, os embarques somaram 22,15 milhões de sacas, redução de 21%, mas com faturamento em alta de 36%, para US$ 8,55 bilhões, segundo dados do Cecafé.

O suporte veio de uma combinação de fatores: clima adverso no Sudeste brasileiro, que reduziu a expectativa de safra, especulação mais agressiva nos contratos em Nova York e tarifas impostas pelos Estados Unidos sobre o café solúvel.

Esses fatores desorganizaram os fluxos comerciais e reduziram em quase 60% as exportações desse segmento para o mercado americano em agosto.

Contudo, parte da produção foi redirecionada a outros destinos, mas a mudança exige readequação logística e comercial.

A safra projetada para 2025/26 gira em torno de 63,35 milhões de sacas, com cerca de 38 milhões de arábica — números menores que os recordes passados, mas suficientes para manter o país como líder global.

O ponto de pressão, no entanto, está nos custos: levantamento da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) aponta aumentos de mais de 23% em algumas regiões, com a mão de obra avançando 21% e elevando o Custo Operacional Efetivo por saca em até 13%.

Para exportadores bem estruturados, com contratos de hedge em dólar e fixações oportunas em Nova York, os preços elevados compensaram o real valorizado e preservaram parte da margem.

Para produtores menores ou menos capitalizados, a equação é mais difícil. A combinação de custos crescentes, câmbio forte e necessidade de liquidez força vendas em momentos menos favoráveis, reduzindo o ganho em reais mesmo com a cotação internacional em alta.

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Perda de produtividade amplia fragilidade do açúcar

Se o café encontra suporte em preços externos, o açúcar enfrenta uma conjuntura mais adversa. A produtividade média da cana no Centro-Sul, principal região produtora, recuou em agosto para 77,5 toneladas por hectare, abaixo do registrado no ano anterior.

A qualidade da matéria-prima também cedeu: o Açúcar Total Recuperável (ATR), medida de doçura da cana e determinante para o rendimento industrial, caiu 2,9%, para 144,2 kg por tonelada.

No acumulado da safra, o encolhimento é ainda mais significativo, com o ATR recuando de 133,2 para 129,7 kg/t. Essa deterioração eleva o custo unitário de produção em um momento em que os preços internacionais do açúcar testam mínimas de dois meses e meio.

A oferta mais ampla, com usinas direcionando a maior parte do mix para o adoçante, aumenta a percepção de excesso global e pressiona as cotações na ICE.

Para exportadores, a valorização do real agrava a redução: além de receber menos reais por tonelada vendida, o setor enfrenta produtividade menor, ATR mais baixo e custos fixos em alta. Algumas usinas buscam resposta no etanol, ajustando o mix para aproveitar momentos de melhor remuneração. Mas a flexibilidade é limitada.

Afinal, parte da produção já está comprometida por contratos de exportação e o mercado doméstico de biocombustíveis também enfrenta volatilidade. O resultado é um quadro de margens comprimidas, sobretudo para usinas mais alavancadas e com menor eficiência operacional.

Entre resiliência e vulnerabilidade

O contraste entre café e açúcar revela que o câmbio é apenas um denominador comum, mas não o fator decisivo. No café, preços internacionais em alta e oferta global ajustada garantem um colchão contra o real valorizado.

No açúcar, o choque cambial se soma a fundamentos negativos: produtividade em queda, ATR menor e percepção de excesso no mercado internacional.

Essa divergência evidencia a fronteira entre setores que conseguem administrar risco e aqueles mais expostos a oscilações externas.

Exportadores de café com governança comercial sólida preservam ganhos mesmo em ambiente adverso; no açúcar, usinas sem flexibilidade ou hedge robusto se tornam vulneráveis a margens negativas.

José Carlos Sanchez Jr.

José Carlos Sanchez Jr.

Jornalista e redator especializado em economia, finanças e investimentos, com experiência em cobertura de mercado, políticas públicas e programas sociais. É Administrador de Empresas com MBA em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Autor e fundador do portal IA do Dinheiro.

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