Tel Aviv (Israel) — Documentos oficiais divulgados pela ONG Hatzlaha revelam que, durante os bombardeios contra Gaza em 2024, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu manteve uma articulação intensa com o ex-premiê britânico Tony Blair e com influentes republicanos dos Estados Unidos, numa ofensiva diplomática paralela às pressões internacionais sobre a conduta de Israel.
As anotações do diário oficial de Benjamin Netanyahu referentes ao ano de 2024, obtidas a partir de pedido público e analisadas pelo jornal israelense Haaretz, trazem um retrato incomum do funcionamento diplomático de Israel durante um dos períodos mais sangrentos da ofensiva contra Gaza.
Em meio aos ataques e às acusações internacionais de violações humanitárias, o premiê dedicou tempo significativo a encontros reservados com figuras-chave da política internacional, especialmente do eixo conservador anglo-americano.
Segundo o levantamento, Netanyahu se reuniu sete vezes com o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair ao longo daquele ano. Blair, que voltou a assumir protagonismo regional como peça escolhida para liderar a reconstrução pós-guerra em Gaza, passou a integrar uma articulação diplomática que opera sob supervisão do governo norte-americano.
A presença recorrente do ex-premiê britânico nas agendas revela um alinhamento político mais profundo que o oficialmente reconhecido — e sugere o esforço de Israel para moldar os rumos do pós-conflito ainda durante a guerra.
A agenda também expõe o peso dos aliados republicanos no Senado dos Estados Unidos na estratégia de Netanyahu. O premiê falou pelo menos nove vezes com o senador Lindsey Graham, figura central da ala mais combativa do Partido Republicano.
Os contatos ocorreram justamente no momento em que a Casa Branca, sob Joe Biden, endurecia o tom contra Israel, suspendendo a entrega de alguns armamentos diante das ameaças de uma ofensiva de grande escala sobre Rafah.
Pouco após uma das conversas com Netanyahu, Graham foi ao plenário do Senado defender publicamente o abastecimento militar irrestrito ao Estado israelense. A posição ecoou a fala que havia repercutido nos bastidores: segundo ele, deixar de fornecer armas em “um momento de grande perigo” faria os Estados Unidos “pagarem um preço”.

O senador também mobilizou congressistas para tentar barrar o mandado de prisão emitido pelo Tribunal Penal Internacional contra Netanyahu, classificando o tribunal como “tendencioso e corrupto”.
A presença republicana na agenda oficial reforça a estratégia de Netanyahu na época de driblar o desconforto diplomático com o governo Biden, aproximando-se de setores que enxergam o conflito sob uma ótica de alinhamento geopolítico rígido.
A articulação mostra como o premiê buscava ancorar sua política militar em Washington por meio de aliados mais ideológicos, evitando depender exclusivamente das variações do posicionamento da Casa Branca.
Além dos contatos com o Reino Unido e com parlamentares norte-americanos, o diário registra um episódio até então não divulgado: uma ligação, em 29 de outubro de 2024, com Mohammed Bin Zayed, presidente dos Emirados Árabes Unidos.
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O telefonema, que não entrou nos comunicados oficiais, aconteceu no auge das negociações envolvendo países do Golfo, que tentavam evitar uma escalada regional ainda maior. O fato de o diálogo ter sido omitido publicamente reforça a sensibilidade das articulações diplomáticas tocadas por Netanyahu naquele momento.
O conjunto de encontros e conversas revela uma agenda que operava, muitas vezes, longe do campo institucional tradicional, com forte centralidade de figuras ligadas ao conservadorismo internacional.
Em meio à pressão global pelo cessar-fogo, à suspensão temporária de armas por parte dos Estados Unidos e à crescente repercussão do alto número de civis mortos em Gaza, Netanyahu buscou garantir apoio político em bastidores que transcenderam as vias diplomáticas formais.
O movimento demonstra que, mesmo fragilizado internacionalmente, ele ainda mobilizava alianças capazes de influenciar debates estratégicos no Ocidente.
Os registros da agenda de 2024 não apenas iluminam a rede paralela de articulação construída por Netanyahu, como também evidenciam um esforço para contornar críticas, manter apoio militar e moldar o pós-guerra ao lado de aliados políticos.
Em meio à devastação em Gaza e à deterioração da imagem internacional de Israel, o premiê investiu tempo e capital político em consolidar parcerias que fortalecessem sua posição, num cenário em que diplomacia e política doméstica se entrelaçam com intensidade crescente.
Se o conflito redefiniu a geopolítica regional, os documentos mostram que também redesenhou as alianças pessoais e estratégicas de um dos líderes mais longevos — acusado globalmente de conduzir uma campanha genocida contra o povo palestino.











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