Brasília (DF) — O marco legal do combate ao crime organizado deve ser votado nesta terça-feira (18) no Plenário da Câmara, após intensa negociação entre governo, líderes partidários e representantes das forças de segurança. O presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou nesta segunda-feira (17) estar confiante na aprovação do projeto (PL 5582/25), apontado por ele como a deliberação mais relevante do ano diante do avanço das facções criminosas no país.
A proposta, relatada pelo deputado Guilherme Derrite (PP-SP), chegou à quarta versão do parecer em poucos dias, evidenciando a disputa por protagonismo político em um tema de alto impacto público. Ex-capitão da Rota — unidade tática da Polícia Militar paulista — Derrite foi afastado da corporação após acusações de excesso de letalidade, o que mobiliza críticas de parlamentares e especialistas preocupados com riscos de endurecimento sem controle institucional.
O cerne do texto prevê o aumento de penas para crimes ligados ao domínio de territórios e obstrução de vias, além de mecanismos de intervenção em estruturas econômicas das facções. A proposta também pretende facilitar o acesso a ativos e movimentações financeiras que sustentam o crime organizado, com o objetivo de atacar seus recursos antes mesmo de condenações definitivas.
Na prática, o debate atual expressa uma tensão conhecida na democracia brasileira: como fortalecer o Estado na proteção da população sem flexibilizar direitos ou abrir margem para abusos legais. Críticos do projeto apontam que, ao mesmo tempo em que facções dominam comunidades, a ausência histórica do Estado nesses territórios exige mais do que repressão — requer políticas sociais, desenvolvimento urbano e presença institucional permanente.
A pressa para votar a proposta reflete a urgência de uma resposta do Poder Público à sensação de vulnerabilidade que afeta especialmente bairros periféricos e fronteiras logísticas do país. Governadores e prefeitos relatam perdas econômicas com ataques a transportes, comércio sob ameaça e desvio de cargas. Por isso, a demanda por segurança, antes concentrada na retórica eleitoral, agora se impõe como pressão cidadã.
Ainda assim, o processo legislativo acelerado levanta alertas sobre a solidez do texto final. Quatro versões em tão pouco tempo indicam fragilidade de formulação e risco de lacunas normativas — problemas que, em um tema tão sensível, podem gerar efeitos indesejados e disputas judiciais prolongadas. O equilíbrio entre rapidez e qualidade técnica será parte decisiva na análise do Senado.
O presidente da Câmara defende que a escolha de Derrite para a relatoria foi técnica e que a população “não aguenta mais ver o crime tomar conta das cidades”. No entanto, a influência de figuras associadas ao punitivismo policial gera desconfiança em setores que defendem segurança com controle democrático, ressaltando que políticas de encarceramento e confronto, quando isoladas, historicamente fracassaram em reverter indicadores de violência no Brasil.
Leia Mais
Se aprovado com responsabilidade institucional, o marco legal pode fortalecer a investigação e a atuação coordenada entre União, estados e municípios, além de ampliar a capacidade de resposta do Estado em regiões capturadas pelo crime. Mas, se a legislação ignorar contextos sociais e limites democráticos, o país corre o risco de repetir o padrão que já conheceu: mais prisões e confrontos, sem redução consistente da violência.
O Brasil chega a esta votação diante de um teste duplo: proteger vidas e comunidades do domínio de facções, enquanto reforça o Estado Democrático de Direito. O resultado dessa equação começa a ser desenhado nesta terça-feira, no Plenário da Câmara — onde segurança e democracia precisam, mais do que nunca, caminhar juntas.











Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.
Ainda não há comentários nesta matéria.