Geração Z
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Brasília — O mercado de trabalho brasileiro enfrenta um desafio estrutural com a ascensão da Inteligência Artificial (IA), que expõe a vulnerabilidade profissional da Geração Z (nascidos entre 1997 e 2012). Considerados nativos digitais, esses jovens carecem de pensamento analítico e empatia, cruciais para a nova economia, em um cenário onde a pandemia acelerou em dez anos o desenvolvimento tecnológico. Especialistas alertam que a dificuldade de adaptação, somada à dependência da IA, exige uma reorientação urgente na educação e intervenção do Estado para garantir a empregabilidade da juventude.

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A crise de identidade profissional e a síndrome do impostor tecnológico observadas na Geração Z são, na verdade, sintomas da inação estatal em face da revolução digital. A sociedade atribui o rótulo de “nativos digitais” aos jovens, gerando uma falsa expectativa de domínio tecnológico.

No entanto, o mestre e doutorando em Educação, Linguagem e Tecnologias, Augusto Narikawa, desmonta essa premissa, destacando que a simples conectividade não garante a formação de profissionais críticos.

“A grande crítica à Geração Z e à utilização da inteligência artificial é a não formação de profissionais críticos”, aponta Narikawa, sublinhando que a responsabilidade primária por essa formação cabe ao sistema educacional, que se mostra lento em se adaptar.

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A ausência de diretrizes curriculares que incorporem a ética e o uso crítico da IA expõe a juventude. Narikawa explica que a facilidade em obter respostas prontas das ferramentas de IA contrasta com a dificuldade em desenvolver soluções criativas e humanas.

“A IA vai te dar uma resposta lógica e concreta, mas dentro de uma empresa há outros fatores que independem, precisa de empatia, precisa do lado humano, precisa desse contexto humanizado”, defende.

Nesse contexto, o Estado precisa atuar como regulador e indutor de uma educação que valorize as competências humanas que a automação não pode replicar: o pensamento estratégico e o domínio de gestão.

A aceleração tecnológica, forçada pela pandemia, que desenvolveu uma tecnologia de dez anos em apenas dois, agravou o descompasso. Esse crescimento exponencial atingiu uma geração que já busca um novo conceito de bem-estar profissional, contrastando com o modelo workaholic anterior.

Narikawa cita o sociólogo Zygmunt Bauman para ilustrar o paradoxo: “Somos inundados de informação e famintos de sabedoria.” A falha em prover o instrumental para processar essa informação transforma a autonomia em insegurança.

Geração Z
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

A diretora de Talentos da TH Gestão e Pessoas, Amanda Silvestre, concorda com a necessidade de uma mudança de foco, enfatizando que o problema não é a substituição de pessoas pela IA, mas sim a substituição de “pessoas que não se atualizaram e não aprenderam a utilizar as ferramentas”.

Para ela, a empregabilidade na era da automação exige que o profissional saiba fazer as perguntas certas, reforçando a importância do entendimento de base – o qual é dever da educação formal prover.

O papel do Estado se torna ainda mais relevante ao considerar o impacto da crise de identidade e propósito da Geração Z. Motivados por “trabalho com significado”, esses jovens enfrentam um mercado de trabalho que, pós-pandemia, viu o crescimento do formato híbrido e o consequente “afastamento entre as pessoas”, segundo Amanda Silvestre.

A falta de conexões e pertencimento, essenciais para essa geração, gera insegurança, e as empresas respondem com a criação de ambientes que buscam promover a “segurança psicológica”.

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No entanto, a alta taxa de ansiedade e depressão no Brasil, como lembra a executiva, transcende a gestão corporativa e clama por uma resposta coordenada nas áreas de saúde e trabalho.

A transformação é tão profunda que já se reflete nas universidades, com cursos de tecnologia, ciência de dados e gestão de IA superando a concorrência tradicional.

No entanto, Narikawa alerta que a dependência excessiva da IA, onde alunos estruturam trabalhos sem compreender o conteúdo, é “muito perigoso” e expõe a ausência de preparo emocional e comunicacional. Para ele, a condição humana – o olhar crítico e a empatia – é insubstituível e precisa ser o eixo da reforma educacional.

Amanda Silvestre finaliza a análise ao citar o filósofo Christophe Dejours: “O trabalho é sempre uma fonte de prazer e sofrimento”. A executiva aponta que a Geração Z, que tende a evitar o desconforto, precisa de resiliência e amadurecimento, características que nascem da superação de desafios.

O Estado, portanto, não apenas deve preparar a juventude para as demandas técnicas da IA, mas também assegurar um arcabouço social e educacional que promova a solidez emocional necessária para que os jovens encontrem “o seu objetivo final” em um ambiente de trabalho cada vez mais volátil e dependente de soft skills humanas.

José Carlos Sanchez Jr.

José Carlos Sanchez Jr.

Jornalista com foco em economia e sociedade, dedica-se a investigar como decisões econômicas, políticas e sociais se entrelaçam na construção de um Estado de bem-estar social no Brasil.

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