Rio de Janeiro (RJ) — O recuo de 0,4% na produção industrial em setembro é mais do que uma oscilação mensal: é o retrato de uma economia travada por juros altos e crédito caro. Com a taxa Selic mantida em 15% — o maior patamar desde 2006 —, a política monetária brasileira continua drenando o capital produtivo e enfraquecendo o motor do crescimento. O dado, divulgado nesta terça-feira (4) pelo IBGE, mostra que a indústria voltou a perder fôlego, anulando parte da alta de agosto e deixando claro que o custo do dinheiro se tornou o principal entrave ao investimento.
A Pesquisa Industrial Mensal revelou queda em 12 dos 25 segmentos analisados. Setores de alto valor agregado, como farmoquímicos, veículos e mineração, foram os que mais sentiram o impacto.
O gerente do estudo, André Macedo, explica que o movimento é reflexo direto da política de juros: “Com o crédito restrito e caro, empresas adiam planos de expansão e consumidores evitam compras de maior valor. O juro alto afeta as decisões de investimento e consumo.”
A Selic em 15% significa que o país remunera o capital financeiro em ritmo de bonança, enquanto o capital produtivo opera sob asfixia. Desde que o Banco Central iniciou a escalada de juros, em 2023, a indústria acumula quatro quedas em seis meses.
A inflação, hoje em 5,17% no acumulado de 12 meses, está acima do teto da meta (4,5%), mas a trajetória é de desaceleração — o que levanta a dúvida sobre a coerência de manter a taxa nesse nível.
Na prática, a política monetária de 2025 reencena um dilema conhecido: controlar preços à custa da atividade produtiva. Economistas apontam que, com juros reais acima de 8%, o Brasil inviabiliza a expansão industrial e reforça a lógica do rentismo — o lucro fácil no mercado financeiro substitui o risco e o retorno do investimento.
Segundo o economista André Lara Resende, a política de juros elevados cria uma distorção em que investir em títulos públicos se torna mais atraente do que financiar a produção — uma crítica compartilhada por Luiz Gonzaga Belluzzo e Nelson Marconi.
A consequência é uma indústria sem horizonte. O parque produtivo brasileiro envelhece, perde competitividade internacional e se distancia das transformações tecnológicas que marcam a reindustrialização verde no mundo.

Enquanto países centrais estimulam crédito barato e investimento em inovação, o Brasil persiste em um receituário de austeridade monetária que encarece a produção e aprofunda a desindustrialização.
O dado do IBGE mostra que, apesar da recuperação parcial após a pandemia, a indústria ainda está 14,8% abaixo do pico histórico de 2011. Em outras palavras, o país perdeu quase 15 anos de crescimento.
A Selic alta agrava o problema ao aumentar o custo de capital de giro e frear o crédito de longo prazo. Para pequenas e médias empresas, a taxa inviabiliza novos investimentos. Para grandes corporações, adia planos de automação e transição energética.
Além do efeito interno, também há fatores externos que amplificam a crise. O chamado “tarifaço americano”, imposto por Washington sobre produtos brasileiros, afetou exportações em segmentos estratégicos como autopeças e siderurgia.
Mas o peso maior continua sendo doméstico: o custo do dinheiro. Em termos reais, o juro brasileiro é o mais alto do mundo — uma anomalia que neutraliza qualquer política industrial ou fiscal.
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A lógica que sustenta essa política monetária vem sendo questionada até por ex-presidentes do Banco Central. Para parte da academia, o regime de metas de inflação, importado nos anos 1990, tornou-se um mecanismo automático de punição ao crescimento.
No modelo atual, a estabilidade de preços é tratada como objetivo absoluto, mesmo que à custa do investimento, do emprego e da inovação.
A desaceleração industrial de setembro é, assim, o sintoma de um problema mais profundo: a desconexão entre a política monetária e o desenvolvimento produtivo.
O país que produz menos porque paga caro para investir não está combatendo a inflação — está consolidando a estagnação. Em um cenário global de reindustrialização verde e revolução tecnológica, o Brasil segue refém de um sistema financeiro que prospera sobre o imobilismo do setor produtivo.
Enquanto o Copom celebra prudência, a indústria paga a conta. O preço do rentismo é o mesmo há décadas: fábricas ociosas, empregos escassos e um crescimento que insiste em não sair do lugar.










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