China

Pequim (CHN) — O gigante asiático registrou em outubro seu período mais longo de retração industrial em quase uma década, com o Índice de Gerentes de Compras (PMI) oficial caindo para 49,0 pontos. Este é o sétimo mês consecutivo que o setor manufatureiro chinês se encolhe, segundo dados do Escritório Nacional de Estatísticas (NBS). O resultado confirma que a retomada econômica da China está sendo severamente contida por uma combinação complexa de fragilidade crônica na demanda doméstica e a manutenção de incertezas no ambiente comercial global.

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O indicador, que permanece teimosamente abaixo da linha de 50 (limiar entre expansão e contração), atesta uma debilidade profunda no motor fabril da China. Ao examinar os componentes do PMI, percebe-se a gravidade do quadro: a produção retrocedeu, e o volume de novas encomendas — o termômetro tanto da demanda interna quanto das exportações — mergulhou para níveis de baixa que rivalizam com o pior momento de 2023.

Embora o NBS tenha tentado mitigar o impacto, atribuindo parte do recuo ao feriado nacional de oito dias, a persistência de sete meses de contração sugere que o problema é muito mais profundo do que simples fatores sazonais.

A demanda doméstica continua anêmica, e o ambiente de exportação, embora aliviado por uma trégua tarifária entre Pequim e Washington, permanece sujeito a volatilidade que inibe investimentos de longo prazo nas cadeias fabris.

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Este cenário expõe o dilema estrutural da China. O país está em uma fase crucial de sua evolução econômica, tentando migrar de um modelo de crescimento excessivamente dependente de investimentos maciços em infraestrutura e exportações para um padrão mais maduro, impulsionado pelo consumo interno, pelo setor de serviços e pela inovação em alta tecnologia.

Os dados de outubro são um lembrete inequívoco de que essa transição está longe de ser completada. O peso do desequilíbrio recai sobre a capacidade produtiva excessiva das fábricas, que segue descompassada da demanda efetiva.

Curiosamente, e em contraste com a indústria, o setor de serviços demonstrou alguma resiliência, com o PMI não manufatureiro ficando ligeiramente acima de 50, beneficiado pelo turismo e consumo de feriado.

No entanto, o avanço dos serviços não possui, no curto prazo, a escala necessária para compensar a massiva contração industrial e a perda de empregos no segmento fabril.

China

Consciente da pressão, o governo chinês acelerou sua resposta política. As medidas incluem a autorização de cerca de 1 trilhão de yuans em títulos especiais destinados aos governos locais, além de estímulos direcionados via bancos de políticas públicas para financiar obras e projetos de infraestrutura regional.

Essa estratégia busca injetar capital de forma controlada, evitando, no entanto, repetir os desequilíbrios do passado, como o endividamento local insustentável e a formação de bolhas imobiliárias.

É uma gestão de risco: a política monetária, embora monitorada pelo mercado para possíveis cortes de juros e redução do compulsório, tem buscado equilibrar a necessidade urgente de liquidez com a prudência fiscal.

As consequências dessa retração industrial transcendem as fronteiras chinesas, afetando diretamente a economia global. Para nações em desenvolvimento, especialmente aquelas cuja receita depende da exportação de matérias-primas — como o Brasil, grande fornecedor de minério e insumos energéticos —, o menor apetite da China reduz a demanda, pressionando preços e receitas.

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Nesse sentido, o episódio reforça uma lição de que a exposição desmedida a choques na demanda global impõe custos reais à estabilidade. Tal vulnerabilidade exige que as economias construam estratégias robustas de diversificação produtiva e de mercado, mitigando a dependência excessiva de um único grande comprador ou de ciclos de estímulo externo que tornam volátil a trajetória de emprego e investimento doméstico.

A leitura final é que a China permanece como um motor econômico indispensável, mas sob novas regras. A era em que seu crescimento era dado como garantido pela simples expansão fabril chegou ao fim.

O teste crucial será a capacidade do país de acelerar a mudança de seu modelo econômico para um mais focado em valor agregado, tecnologia e consumo.

Para o Brasil e demais parceiros, o cenário impõe a necessidade de políticas externas proativas que aumentem a resiliência e que busquem, ativamente, oportunidades de inserção em novas cadeias de valor, em vez de apenas reagir passivamente ao ciclo de contração e estímulo do gigante asiático.

José Carlos Sanchez Jr.

José Carlos Sanchez Jr.

Jornalista com foco em economia e sociedade, dedica-se a investigar como decisões econômicas, políticas e sociais se entrelaçam na construção de um Estado de bem-estar social no Brasil.

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