Belém (PA) — O ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Guilherme Boulos, afirmou nesta segunda-feira (17) que nenhuma obra em rios da Amazônia, como o Tapajós, avançará sem consulta prévia às comunidades indígenas e quilombolas. O anúncio ocorreu durante a Marcha Global Indígena, na COP30, diante da maior participação indígena já registrada em uma conferência do clima da ONU — um gesto que vincula desenvolvimento e reconhecimento territorial.
A medida representa uma inflexão no modelo de desenvolvimento da região: a consulta prévia — prevista na Convenção 169 da OIT — deixa de ser exceção contestada nos tribunais e se torna princípio de Estado para decisões que afetam territórios originários.
A política é uma vitória histórica dos povos indígenas, frequentemente excluídos de processos que definem o destino de seus rios, suas florestas e seus modos de vida.
Além de Boulos, participaram da marcha as ministras Sônia Guajajara (Povos Indígenas) e Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima). O cortejo, da Aldeia COP — montada no campus da Universidade Federal do Pará — ao Bosque Rodrigues Alves, reuniu povos do Brasil e de outros países, com bandeiras que vão do fim do desmatamento ao acesso direto ao financiamento climático, além da defesa dos territórios como solução concreta para a crise ambiental.
A reivindicação indígena pela consulta prévia vem de longa data. Obras de grande impacto — barragens, hidrovias, mineração — avançaram por décadas sobre terras indígenas sem aval das comunidades afetadas.
Em muitos casos, os resultados foram destruição de peixes, alagamentos de aldeias, contaminação de rios e fragmentação de culturas que dependem do equilíbrio ecológico.
Ao assumir publicamente a exigência de consulta como política permanente, o governo Lula faz um gesto político que corrige omissões históricas e reposiciona os povos originários não como “obstáculos ao progresso”, mas como protagonistas de um futuro sustentável.

A fala de Boulos ecoa o entendimento de que proteger territórios indígenas não é só justiça social: é uma das formas mais eficazes de conter emissões de carbono e preservar a biodiversidade.
O ministro destacou que novas homologações de terras indígenas estão em preparação, com anúncios previstos ainda durante a COP30. Guajajara reforçou o compromisso e afirmou que o país deve sair de Belém com portarias declaratórias assinadas e territórios reconhecidos — uma agenda que encontra forte resistência política no Congresso e em setores econômicos interessados na expansão mineral e fundiária sobre áreas protegidas.
Representantes internacionais presentes no ato relataram desafios semelhantes na África, na Ásia e no Canadá. A marcha, portanto, também se consolida como um movimento transnacional de povos originários, que buscam transformar direitos territoriais em política climática global — indo além da retórica para influenciar decisões de financiamento e acordos internacionais.
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O gesto do governo brasileiro ocorre no momento em que o mundo discute a transição ecológica e novos modelos de desenvolvimento para os países que guardam grande parte da biodiversidade planetária. Com a COP30 na Amazônia, o Brasil assume liderança moral: não haverá solução climática sem justiça territorial.
Ao colocar a voz indígena no centro das decisões sobre o uso da água e da floresta, o país sinaliza que o desenvolvimento do século XXI não cabe mais nas mesmas estruturas que geraram destruição e desigualdade: escutar os povos da floresta não é concessão — é estratégia de sobrevivência.











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