A Polícia Federal apreendeu R$ 430 mil em espécie na casa do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e cumpriu mandados contra ele e Carlos Jordy (PL-RJ) nesta sexta-feira (19), no Rio e no Distrito Federal, em investigação sobre desvio de recursos da cota parlamentar por meio de contratos falsos com locadoras de veículos.
A operação, autorizada pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, aprofunda suspeitas de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa envolvendo dois dos principais líderes do bolsonarismo no Congresso.
A investigação aponta que empresas ligadas a assessores teriam recebido recursos públicos para serviços que não existiam, enquanto movimentações financeiras incompatíveis com a renda dos envolvidos somam dezenas de milhões de reais.
A cena dos maços de dinheiro apreendidos, embalados pela PF, sintetiza visualmente a gravidade do caso e mostra o abismo entre o discurso moralista do PL e a prática revelada pelas apurações.
Mais do que um episódio isolado, a Galho Fraco evidencia uma engrenagem que reproduz um velho padrão de uso privado do dinheiro público: contratos artificiais, empresas de fachada, simulação de serviços e um trajeto financeiro que começa em recursos parlamentares e termina sem clareza de destino.
A Procuradoria-Geral da República aponta indícios de conluio entre assessores dos deputados para dar aparência de legalidade às operações, sugerindo que o desvio não seria fruto de improviso, mas de planejamento.
Em um país que enfrenta desigualdades profundas, é impossível ignorar a dimensão simbólica de valores tão altos circulando clandestinamente enquanto a população luta para acessar direitos básicos.

Politicamente, o impacto é inevitável. Sóstenes é líder do PL na Câmara e uma das vozes mais agressivas contra o STF. Recentemente, acusou ministros de “autoritarismo” e “perseguição”. Agora, é justamente o Supremo quem autoriza a investigação sobre possíveis crimes vinculados à estrutura que ele lidera.
Jordy, por sua vez, reagiu com o discurso tradicional do bolsonarismo: chamou a operação de “covarde” e alegou perseguição, tentando transformar um caso de polícia em narrativa política. O roteiro é conhecido: quando as instituições funcionam, a extrema direita tenta deslegitimá-las.
Mas a questão central não é a indignação ensaiada. É a coerência — ou a falta dela. O PL construiu seu discurso nacional vendendo uma imagem de “defesa da moral”, combate à corrupção e suposta superioridade ética em relação a adversários políticos.
Na prática, o que os inquéritos revelam é um partido profundamente atravessado por práticas típicas do patrimonialismo brasileiro: apropriação de recursos públicos, uso político do Estado e redes de proteção para preservar privilégios. É a velha política travestida de novidade, com nova estética, mas velhos métodos.
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A Operação Galho Fraco também recoloca em evidência o papel das instituições republicanas. A Polícia Federal atua com base em evidências, o Ministério Público aponta caminhos e o STF autoriza as medidas dentro dos limites constitucionais.
Não se trata de interferência política, mas de funcionamento do Estado de Direito. Ao rebater críticas do Congresso, Dino afirmou que a Corte não legisla nem executa, apenas exerce controle constitucional diante de indícios de irregularidade.
Em outras palavras, quem está sob suspeita não é perseguido, mas investigado dentro das regras democráticas.
No Congresso, o clima é de tensão. O silêncio de Sóstenes contrasta com o tom inflamado habitual. Aliados evitam defesa entusiasmada. A apreensão em dinheiro vivo — sempre um elemento que pesa politicamente — torna a situação ainda mais constrangedora.
Não é apenas a suspeita; é a materialidade da imagem. Em uma conjuntura em que parte da extrema direita tenta sustentar a narrativa de que instituições agem politicamente, operações com esse grau de evidência dissolvem o discurso e recolocam o debate no terreno concreto: o uso do dinheiro público.
O processo agora segue seu curso judicial, com direito à defesa e análise das provas. Mas o desgaste político já está instalado, e o recado institucional é que a retórica moralista não protege ninguém.
A democracia brasileira, ainda em reconstrução após sucessivas crises, mostra que tem anticorpos. E, se confirmadas as suspeitas, a Operação Galho Fraco não será apenas um capítulo policial, mas mais uma demonstração de que parte da elite política que se diz “guardiã da moral” continua operando sob a velha lógica de transformar o Estado em oportunidade privada.











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