Tarcísio
Foto: Lula Marques/Agência Brasil.

Brasília (DF) — O anúncio de que Flávio Bolsonaro seria o nome escolhido pelo pai para disputar a Presidência em 2026 provocou um silêncio calculado do governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, que não se manifestou desde sexta-feira (5). A falta de reação pública do aliado, tido como alternativa competitiva da direita ao Palácio do Planalto, tornou mais nítidas as disputas internas no campo conservador e mostrou a fragilidade das costuras políticas que sustentam o grupo desde 2018.

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O distanciamento ocorreu no momento em que Tarcísio ainda sinalizava, nos bastidores, interesse em disputar a Presidência com apoio do centrão, apesar de reiterar a intenção de buscar a reeleição.

A decisão repentina de Jair Bolsonaro, preso e sem direitos políticos, reorganizou o tabuleiro e colocou o senador Flávio no centro da estratégia familiar — movimento que muitos na direita interpretaram como um recado a quem tentava construir caminhos próprios fora do núcleo bolsonarista.

A escolha acirrou reações dentro do próprio grupo. No sábado (6), Eduardo Bolsonaro usou as redes para dizer que a candidatura do irmão era um “xeque-mate” contra dirigentes e pré-candidatos apoiados por setores que ele chamou de “sistema”, numa referência direta às articulações de Tarcísio com o centrão.

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A declaração reforçou o clima de disputa interna sobre quem liderará a extrema direita em 2026, num cenário em que o capital político do bolsonarismo permanece relevante, mas fragmentado.

Em entrevista à TV Record, Flávio Bolsonaro tentou minimizar o incômodo causado pelo anúncio e afirmou ter informado Tarcísio previamente.

Disse ainda que o governador teria reagido “bem” e se mostrado disposto a colaborar, embora não tenha dado qualquer demonstração pública deste alinhamento. O senador acrescentou que não cobraria manifestações formais de apoio, enfatizando que Tarcísio tem repetido a intenção de concorrer novamente ao governo paulista.

Tarcísio
Crédito: Vinicius Rosa / Governo do Estado de SP

A turbulência ganhou novo capítulo quando o próprio Flávio passou a oscilar sobre sua candidatura. Em menos de 72 horas, apresentou três versões distintas: primeiro, disse ter sido escolhido pelo pai; depois, insinuou recuar mediante um “preço”; e, por fim, reafirmou que não desistiria.

Na mesma entrevista televisiva, afirmou que esse “preço” seria “Bolsonaro livre e nas urnas”, expressão que vinculou sua permanência na disputa a uma eventual liberação do ex-presidente.

As idas e vindas alimentaram críticas e ampliaram a percepção de improviso dentro do bolsonarismo. Em resposta pública, o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, classificou as declarações do senador como “blefe” e “pastelão”, afirmando que a oscilação evidencia um método baseado em chantagem política.

O petista também argumentou que qualquer tentativa de transformar o debate em negociação para anistiar Bolsonaro seria inconstitucional e afrontaria o Estado Democrático de Direito.

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O embate interno deixa claro a dificuldade do bolsonarismo de consolidar uma liderança capaz de absorver sua base social e, ao mesmo tempo, dialogar com setores que poderiam ampliar seu alcance eleitoral.

A prisão de Jair Bolsonaro e a ausência de um comando político claramente definido contribuíram para que disputas antes mantidas sob controle viessem à superfície.

A hesitação de Tarcísio em apoiar publicamente Flávio sugere que o governador preserva margem para recompor alianças sem se subordinar integralmente ao núcleo bolsonarista — sobretudo porque sua competitividade eleitoral depende de apoios que vão além da base radical do ex-presidente.

À medida que 2026 se aproxima, a disputa tende a revelar até que ponto o pacto interno da direita sobreviverá às pressões por protagonismo.

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O episódio mostra o contraste entre a instabilidade do bloco bolsonarista e a tentativa de reconstrução institucional promovida por setores que defendem previsibilidade, respeito às regras democráticas e estabilidade econômica.

Dessa forma, o processo eleitoral de 2026 se desenha, assim, como um teste sobre qual projeto de país terá capacidade real de se apresentar como alternativa viável diante de uma sociedade que rejeita rupturas e cobra responsabilidade pública.

Para além das disputas pessoais, o silêncio de Tarcísio funciona como termômetro de um movimento maior: a redefinição das fronteiras da direita num país que ainda lida com os efeitos de anos de radicalização.

O posicionamento — ou sua ausência — poderá indicar se o governador tentará se firmar como liderança própria ou se a extrema direita seguirá subordinada às decisões familiares que moldaram o bolsonarismo na última década.

José Carlos Sanchez Jr.

José Carlos Sanchez Jr.

Jornalista e editor-chefe da IA Dinheiro. Produz reportagens e conteúdos com foco em economia, democracia, desigualdade e políticas públicas.

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