Habitação verde
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

São Paulo (SP) — Ao lançar uma plataforma que mede o carbono incorporado nas moradias do Minha Casa, Minha Vida, a Caixa Econômica Federal tenta converter a política habitacional em política climática. Desenvolvido em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), o sistema busca reduzir o uso de materiais de alto impacto e o custo de produção de moradias populares. A iniciativa insere o banco público no debate global sobre descarbonização da construção civil e reforça o papel do Estado como agente da transição sustentável.

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Chamada de Benchmark Iterativo para Projetos de Baixo Carbono (BIPC), a ferramenta foi apresentada no evento “Habitação de baixo carbono: experiências globais e soluções locais”, realizado na capital paulista.

Ela permite avaliar o impacto ambiental de cada projeto habitacional, com base na tipologia construtiva, número de pavimentos e materiais empregados. O foco inicial será em empreendimentos financiados pelo Minha Casa, Minha Vida, que responde por boa parte da produção imobiliária no país.

O coordenador do projeto, professor Vanderley Moacyr John, da Escola Politécnica da USP, explica que o sistema orienta projetistas e construtoras a reduzirem a quantidade de materiais sem comprometer a segurança estrutural.

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“Quando se diminui o volume de materiais, duas coisas acontecem: a pegada de CO₂ cai e o custo da obra também. Esse é o segredo da ferramenta”, afirmou durante o evento.

A lógica rompe com a ideia de que sustentabilidade é cara: aqui, o carbono e o custo caem juntos. Segundo a Caixa, o programa habitacional — que se baseia em padronização e larga escala — oferece uma oportunidade inédita de inovação verde.

A digitalização dos projetos permitirá comparar resultados e identificar boas práticas, criando uma espécie de índice nacional de eficiência de carbono na construção civil.

O banco afirma que, por ser responsável por cerca de 80% do crédito imobiliário brasileiro, a adoção da ferramenta pode transformar o setor inteiro.

Além de contribuir para a meta de neutralizar emissões até 2050, a iniciativa busca democratizar o acesso à mensuração ambiental. O sistema será aberto, permitindo que qualquer profissional consulte a linha de base de carbono de diferentes tipos de construção.

Habitação verde

Para o presidente da Caixa, Carlos Vieira, o objetivo é transformar a sustentabilidade em instrumento de competitividade. “A construção civil representa 10% do PIB e até 25% do emprego nacional. Com essa ferramenta, vamos democratizar o acesso à mensuração do impacto ambiental”, disse.

O banco anunciou também novos compromissos ligados à sua estratégia ESG. Até 2030, pretende ampliar em 50% sua carteira de crédito verde, alcançando R$ 1,25 trilhão em operações voltadas a projetos sustentáveis.

Entre as metas estão o incentivo à economia circular, a redução de resíduos enviados a aterros e a igualdade de gênero na liderança: o objetivo é que mulheres ocupem ao menos 36% dos cargos gerenciais e um terço das posições de diretoria.

A combinação entre tecnologia, política pública e inovação verde recoloca a Caixa no centro da agenda de desenvolvimento. A instituição, historicamente associada a programas sociais, tenta agora traduzir essa presença em impacto climático mensurável.

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A parceria com a USP aproxima o banco do ecossistema científico e reforça uma lógica de política industrial verde, na qual universidades e empresas públicas funcionam como vetores de inovação de baixo custo.

A experiência tem potencial de projeção internacional. Em países de renda média, como o Brasil, onde a urbanização avança de forma desigual, o desafio é equilibrar escala e sustentabilidade.

Ao criar uma base comparativa de carbono na habitação social, a Caixa oferece um modelo de transição acessível a outras nações do Sul Global — um caminho onde política habitacional e economia verde não se excluem, mas se complementam.

A agenda de habitação de baixo carbono também se conecta a metas climáticas mais amplas. O Brasil se comprometeu, no Acordo de Paris, a reduzir em 50% suas emissões até 2030.

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Como o cimento e o aço estão entre os principais emissores do país, a construção civil é peça-chave nessa estratégia. O que antes era tratado como detalhe técnico — o peso de uma viga, a espessura de uma laje — torna-se agora uma decisão ambiental.

No discurso de encerramento do evento, Carlos Vieira resumiu o novo espírito da Caixa:

“Sustentabilidade não é custo, é eficiência. O que é bom para o planeta pode ser bom também para o orçamento.”

O desafio será transformar esse princípio em prática permanente — e fazer da habitação popular não apenas um direito social, mas também um instrumento de futuro climático.

José Carlos Sanchez Jr.

José Carlos Sanchez Jr.

Jornalista com foco em economia e sociedade, dedica-se a investigar como decisões econômicas, políticas e sociais se entrelaçam na construção de um Estado de bem-estar social no Brasil.

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