O governo dos Estados Unidos entrou em shutdown em 1º de outubro de 2025, depois que o Congresso não aprovou o orçamento para o novo ano fiscal. A paralisação parcial interrompe o funcionamento de órgãos federais, afeta centenas de milhares de servidores e reacende o debate sobre o impacto político e econômico da crise em Washington.
O que é um shutdown e como ele funciona
O shutdown é o bloqueio administrativo que ocorre quando o governo americano fica sem autorização legal para gastar. Nos Estados Unidos, o Congresso precisa aprovar 12 leis orçamentárias anuais que financiam agências e departamentos federais. Quando isso não acontece, e nenhuma resolução temporária (continuing resolution) é aprovada, o governo é obrigado a suspender operações consideradas “não essenciais”.
Isso significa que serviços públicos deixam de funcionar, enquanto áreas vitais — como defesa, segurança e controle de fronteiras — continuam operando. Servidores federais são divididos entre “essenciais” e “não essenciais”: os primeiros seguem trabalhando sem salário até a normalização; os segundos são afastados temporariamente, também sem remuneração até o fim do bloqueio.
É a 22ª paralisação federal desde 1976, segundo registros do Congresso americano. Estima-se que entre 750 e 800 mil funcionários federais tenham sido afetados, seja por afastamento temporário (furlough) ou por trabalhar sem remuneração.
Por que o Congresso não chegou a um acordo
Republicanos e democratas travaram uma disputa sobre o tamanho e o destino dos gastos públicos, com foco especial em programas de saúde. O Senado rejeitou duas propostas concorrentes: uma resolução “limpa”, apresentada pelos republicanos e válida até 21 de novembro, e outra versão democrata mais curta, que incluía a restauração de créditos tributários do Affordable Care Act (ACA), o plano de saúde criado na era Obama.

Os republicanos defendem reabrir o governo primeiro e discutir esses pontos depois. Já os democratas se recusam a aprovar qualquer texto que não garanta os benefícios do ACA e outros programas sociais. A divisão impediu a obtenção dos 60 votos necessários no Senado e paralisou as votações.
Na Câmara, controlada pelos republicanos, o recesso até meados de outubro atrasou ainda mais as negociações. A Casa Branca tenta manter pressão sobre o Legislativo, alertando que o bloqueio prejudica a economia e ameaça pagamentos a militares e prestadores de serviço.
Quais setores são mais afetados
As consequências são amplas. Parques nacionais e museus foram fechados ou passaram a operar com equipes reduzidas. Serviços administrativos, emissão de vistos e autorizações ambientais estão suspensos.
O Departamento do Trabalho adiou a divulgação de indicadores como o relatório de emprego (payroll), essencial para o mercado financeiro. A Comissão de Valores Mobiliários (SEC) interrompeu parte das análises de registros corporativos e fiscalizações.
Programas de alimentação infantil, como o WIC, correm o risco de ficar sem recursos em poucas semanas. No setor de habitação, aprovações de novos empréstimos estão paralisadas.
Em contrapartida, atividades consideradas críticas — segurança nacional, transporte aéreo, controle de fronteiras e serviços de saúde emergenciais — seguem operando, embora sob restrições.
Impactos econômicos e reação dos mercados
Historicamente, shutdowns curtos não provocam recessão, mas reduzem o crescimento no trimestre em que ocorrem e afetam a confiança dos consumidores e investidores. Segundo estimativas do Escritório de Orçamento do Congresso (CBO), a paralisação de 2019 custou cerca de US$ 11 bilhões à economia americana, parte irrecuperável.
Desta vez, o bloqueio coincide com um cenário de juros altos, inflação persistente e tensões políticas às vésperas das eleições legislativas. O resultado é um aumento da aversão ao risco nos mercados globais. Investidores buscam ativos seguros, como os títulos do Tesouro americano, o que fortalece o dólar e pressiona moedas emergentes.

No Brasil, o reflexo é sentido no câmbio e nas commodities. Uma desaceleração da economia americana tende a reduzir a demanda global, afetando exportações e investimentos.
O que pode acontecer nas próximas semanas
A expectativa é de que o Senado retome a votação nos próximos dias. Há discussões sobre uma resolução provisória que reabra o governo por algumas semanas, dando tempo para um acordo definitivo.
No entanto, o recesso da Câmara dificulta avanços imediatos, e líderes republicanos admitem que o impasse pode durar até 15 de outubro — data em que militares ativos começariam a ficar sem pagamento.
Analistas políticos independentes avaliam que, embora o shutdown raramente dure mais de três semanas, o cenário atual é mais imprevisível.
Trump tenta se posicionar como defensor do corte de gastos, enquanto democratas o acusam de usar a paralisação como ferramenta eleitoral. Se a crise se prolongar, cresce o risco de rebaixamento da nota de crédito americana e de novas turbulências financeiras.
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O impacto global de uma crise doméstica
A paralisação do governo americano é um evento doméstico, mas com consequências internacionais. A economia dos Estados Unidos representa quase um quarto do PIB mundial, e qualquer ruído político em Washington afeta preços, juros e expectativas em outros países.
Para investidores e governos estrangeiros, o shutdown é visto como um sinal de fragilidade institucional — uma demonstração de que até a maior potência econômica enfrenta entraves internos para gerir suas contas.
Enquanto as negociações continuam no Congresso, o mundo acompanha atento. O desfecho não determinará apenas a reabertura dos escritórios federais, mas também o rumo da política econômica americana em um momento de incertezas globais.